segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

O Natal português


Inês Teotónio Pereira 
ionline 28 Dez 2013

"A consoada não é nada! As pessoas inventaram a consoada e já não vão à missa do galo porque têm de jantar, porque vão comer! Isto não faz sentido, é muito triste?"

No domingo passado fui a uma missa celebrada pelo mítico padre Dâmaso. Era o domingo antes do Natal e o padre holandês estava visivelmente desanimado com a época natalícia e com a forma como as suas ovelhas a viviam. E como já não tem idade, nem feitio, nem paciência para dizer as coisas que pensa com suavidade, foi, digamos, acutilante. Começou o padre Dâmaso por dizer que o Natal não é uma festa de família: "Se quiserem fazer festas de família têm o ano inteiro para as fazer, o Natal é a celebração do nascimento de Jesus. Não é uma festa de família." As famílias presentes agitaram-se. Dizia o padre Dâmaso que durante a Primeira República - marcada pelo anticlericalismo, a perseguição religiosa e o domínio da maçonaria - tudo se fez para transformar o significado do Natal esvaziando-o da sua dimensão espiritual e religiosa e substituindo-a pela celebração da família. Jesus passou então a ter um papel secundário e a família ocupou o lugar do presépio. Passaram-se décadas e a família mantém o lugar cimeiro nesta época e Jesus passou a figurante, na melhor das hipóteses. 
Bastante irritado com o estado de alma dos católicos representados naquela pequena assembleia, o padre Dâmaso continuou: "E a consoada? A consoada não é nada! As pessoas inventaram a consoada, o jantar na véspera de Natal, e já não vão à missa do galo porque têm de jantar, porque vão comer! Isto não faz sentido, é muito triste...", queixava-se o sacerdote holandês. "Onde está Jesus no Natal português?" 
Nem de propósito, no dia seguinte, ouvi a seguinte expressão numa televisão: "O Natal também é celebrado segundo a tradição cristã." Ou seja, para quem não sabe, os cristãos também celebram o Natal. Imaginem só que existe uma coisa chamada missa do galo e, segundo eles, Jesus nasceu no Natal. O Natal afinal não é só família, presentes, peru, bacalhau, farófias e a "Música no Coração", vejam só. Parem as rotativas: há uma dimensão religiosa da coisa! Parece que há um grupo de pessoas dentro do grupo das pessoas católicas que acham que o Natal é a data de nascimento de Jesus, que nasceu e se fez Homem para nos dar a certeza de que Deus vive no meio de nós. E essa malta, que acredita nestas coisas, até vai à missa a meio da noite. Enfim, foleirices. 
Mas o Natal português é moderno, não é foleiro. O nosso Natal é bastante terreno, palpável: é o dia em que nos empanturramos de doces, recebemos presentes, estamos com a família e fazemos a digestão esparralhados num sofá a ver a "Música no Coração" pela centésima vez. Jesus não tem nada a ver com isto. Mesmo para os católicos, cada ano que passa Jesus tem menos a ver com este ritual. O Pai Natal, as crianças e os centros comerciais tomaram conta da festa. No nosso Natal a religião é uma coisa estranha. 
Diz o Papa Francisco que a Igreja precisa de ser um hospital de campanha. Ou seja, que é preciso tratar das feridas urgentes, que é preciso ir ao encontro das pessoas, principalmente dos próprios católicos, e que não basta ter as portas abertas. O nosso Natal é a prova viva dessa urgência. Ou o que sobrará para a história do Natal do Padre Dâmaso será apenas o anúncio do azeite Galo.

quarta-feira, 18 de dezembro de 2013

Um simples minuto

Na noite da consoada, os lugares vazios são preenchidos pelas memórias. Lembrar os que fazem falta é homenagear o amor. Amar os que cá estão é criar memórias para o futuro. Por ser Natal, talvez faça sentido relembrar, reflectir, e sobretudo, dar.



domingo, 15 de dezembro de 2013

Duque de Bragança: “A lei do aborto a pedido tem provocado um genocídio encorajado pelo Estado"

Por Jornal i
publicado em 30 Nov 2013


Para D. Duarte Pio, a baixa natalidade "compromete gravemente a sustentabilidade económica”
O Duque de Bragança apelou hoje aos responsáveis, “em qualquer quadrante político”, para que cheguem a “consensos com base numa ética do interesse nacional e do desinteresse pessoal e partidário”.

“No momento presente, Portugal encontra-se sob dependência de credores e burocratas estrangeiros, devido à irresponsabilidade de governantes que endividaram o País, gastando o que tínhamos em investimentos que não produziram riqueza mas que permitiram ganhos a um número reduzido de privilegiados e que lançaram muitos para o desemprego e pobreza”, lembrou Duarte Pio, na mensagem que assinala as comemorações do 1 de Dezembro.

No entanto, o Duque de Bragança salienta “o magnífico exemplo que os portugueses têm dado no campo da resistência à adversidade e na preocupação com os que precisam de apoio”.

D. Duarte Pio considera que a baixa natalidade em Portugal “compromete gravemente a sustentabilidade económica”. Para o Duque de Bragança, “a lei do aborto a pedido tem provocado um genocídio encorajado pelo Estado e pago com os nossos impostos”.

“Enquanto no ano de 2012 nasceram menos de 90 mil crianças, nos últimos 5 anos foram mortas legalmente mais de 100 mil”, acrescentou.

quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

Liberdade de expressão e juízo sobre a prática homossexual - por Pedro Vaz Patto

In Brotéria
           
 São várias as notícias, umas mais antigas e outras mais recentes, que fazem temer que a pretexto do respeito pela dignidade e não discriminação das pessoas de orientação homossexual, se pretenda limitar, de uma forma generalizada, a liberdade de expressão quanto ao juízo moral sobre a prática homossexual (não sobre a pessoa em si mesma, com a orientação sexual que não escolheu, mas sobre uma conduta e uma prática voluntárias).

            Vejamos algumas dessas notícias.

            O caso que em primeiro lugar suscitou mais clamor foi o da condenação do pastor pentecostal sueco Ake Green. Por ter declarado publicamente, evocando as referências à prática homossexual no Antigo Testamento e nas cartas de São Paulo, que essa prática representa “uma perversão” e um “tumor na sociedade”, e que a tendência homossexual não era inata e era suscetível de mudança, sem ter deixado de afirmar que não condenava as pessoas, pois Jesus nunca inferiorizou ninguém, Ake Green foi judicialmente condenado pelo crime previsto no artigo 16.6, 8 do Código Penal sueco (ameaça ou injúria para com um grupo de pessoas com referência à sua raça, cor, origem nacional ou étnica, confissão, fé ou orientação sexual). Em recurso, veio a ser absolvido, já em 2005 [1].

            Em 2006 o deputado francês Christian Vanneste foi condenado, pela Cour Corretionelle de Lille, por “injúrias públicas contra grupo de pessoas em razão da orientação sexual”, por ter afirmado que o comportamento homossexual é moralmente inferior ao comportamento heterossexual, uma vez que, segundo a máxima kantiana, não pode tornar-se regra universal sem dano para a Humanidade. Em recurso, veio a ser absolvido pela Cour de Cassation, por acórdão de 12 de Novembro de 2008[2].

            Mais recentemente, foi noticiado que o deputado britânico Edward Leight apresentou um projeto de lei (Bill for the protection of freedom of speech and conscience) que pretende a proteção da liberdade de expressão no âmbito das relações de trabalho, de modo a evitar casos como o do Adrian Smith, punido pelo seu empregador por ter manifestado nofacebook a sua oposição à legalização do casamento entre pessoas do mesmo sexo[3].

            Em Março deste ano, o Ministro da Educação do Estado canadiano de Yukon, invocando a legislação que proíbe a discriminação em função da orientação sexual, proibiu o ensino do catecismo da Igreja Católica no que à homossexualidade diz respeito nas escolas católicas que recebem fundos públicos[4]

            Consta desse catecismo o seguinte:

            «Apoiada na Sagrada Escritura, que os apresenta como depravações graves (Gn 19, 1-29; Rm 1, 24-27; 1 Co 6,10; 1 Tim 1,10), a Tradição sempre declarou que os atos de homossexualidade são intrinsecamente desordenados (CDF decl. Persona humana 8). São contrários à lei natural, fecham o ato sexual ao dom da vida, não procedem duma verdadeira complementaridade afetiva e sexual, não podem, em caso algum, receber aprovação» (n. 2358)

            Mas faz-se a distinção entre o pecado e o pecador, entre o erro e a pessoa que erra, pois há que condenar o erro e amar a pessoa que erra:

            «Um número não desprezível de homens e mulheres apresenta tendências homossexuais profundas. Eles não escolhem a sua condição de homossexuais; essa condição constitui, para a maior parte deles, uma provação. Devem ser acolhidos com respeito, compaixão e delicadeza. Evitar-se-á, em relação a eles, qualquer discriminação injusta» (n. 2359)

            Pois bem, foi este o ensinamento proibido nas escolas católicas que recebem fundos públicos do Estado canadiano de Yukon. Proibição que se noticia ter sido acatada[5].

            A questão da distinção entre a condenação do erro e o respeito pela pessoa que erra (“hate the sin, love the sinner”) foi suscitada num outro caso judicial recente, também relativo ao Canadá.

            O Supremo Tribunal canadiano confirmou, em recurso, a condenação, por parte da Comissão de Direitos Humanos da Província de Saskatchewann, de uma pessoa que distribuiu panfletos que condenavam a prática homossexual, apelando aos ensinamentos bíblicos que a apresentam como uma “abominação”, condenando a propaganda da homossexualidade nas escolas, afirmando que esta não é inata e a sua prática representa um comportamento aditivo e envolve uma maior probabilidade de contaminação da SIDA e de abusos sexuais de crianças. Estava em causa a aplicação do artigo 14º, 1, b), do Código de Direitos Humanos dessa Província, que pune o chamado “discurso de ódio” (“hate speech”). Uma punição análoga à do artigo 240º, nº 2, b), do Código Penal português, que, sob a epígrafe “discriminação racial, religiosa ou sexual”, pune a conduta de quem «difamar ou injuriar pessoa ou grupo de pessoas por causa da sua raça, cor, origem étnica ou nacional, religião, sexo ou orientação sexual…».

            A defesa argumentou que os textos em questão conciliavam a condenação do erro com o respeito para com a pessoa que erra (“hate the sin, love the sinner”). Mas o Tribunal não aceitou a relevância desta distinção, considerando que existe uma forte conexão entre a orientação sexual e a conduta sexual, e que quando a conduta visada pelo discurso é um aspeto crucial da identidade de um grupo vulnerável, os ataques a esta conduta são equiparáveis aos ataques ao próprio grupo. Será assim se o ataque a essa conduta provocar objetivamente o ódio e o desprezo pelo grupo[6]

            Situações semelhantes a estas são apresentadas no Relatório de 2012 do Observatório sobre a Intolerância e a Discriminação contra os Cristãos na Europa[7].

            Todos estes episódios estiveram presentes na mente de quem, em Itália, manifestou o receio de que o projeto de lei, recentemente aprovado, sobre a “homofobia” e a “transfobia” (que pune a discriminação e agrava as penas dos crimes cometidos em função da orientação sexual e da “identidade de género”), possa representar um perigo para a liberdade de expressão. Afirmou a propósito o Observatório Internacional Cardeal Van Thuan (dedicado ao estudo e difusão da doutrina social católica)[8]:

            «As notícias que nos chegam de outros países da Europa, onde leis semelhantes já estão em vigor, são alarmantes. Dizer que a família é somente aquela que é constituída por um homem e uma mulher pode ser qualificado como homofobia e perseguição. A leitura pública do livro do Génesis, sobra a criação do homem e da mulher, ou das passagens de São Paulo sobre a imoralidade do ato homossexual, pode ser considerada crime. Ensinar numa escola qua a família é apenas uma pode ser considerado ato de discriminação por ódio homofóbico».

            Também alertou para este perigo, por exemplo, o Forum das Associações Familiares, organismo que agrupa um grande número de associações católicas de apoio à família[9]

            Em atenção a estes alertas, foi proposto por um grupo de deputados católicos um aditamento ao projeto inicial, que por várias pessoas veio a ser denominado “cláusula de salvaguarda”, com o seguinte teor: «Não constituem discriminação as opiniões assumidas no interior de organizações que desempenhem atividades de natureza política, sindical, cultural e sanitária, de instrução, de religião ou de culto, relativas à atuação dos princípios e dos valores de relevo constitucional que caraterizam tais organizações». Este aditamento foi aprovado, mas se há quem considere que com ele fica garantida a liberdade de expressão, esta opinião não é, porém, unânime[10].

            O que a respeito desta questão e de cada um dos casos assinalados me parece de salientar é a importância de traçar uma fronteira que salvaguarde a liberdade de expressão consagrada no artigo 19º da Declaração Universal dos Direitos Humanos, no artigo 37º da Constituição da República Portuguesa e no artigo 10º da Convenção Europeia dos Direitos Humanos. A punição do chamado “discurso de ódio” (“hate speech) não pode servir de pretexto para impor um “pensamento único” e para punir “delitos de opinião”. Não é aceitável que o comportamento homossexual seja imune à crítica ou a um juízo ético, quando a tal crítica ou juízo não são imunes quaisquer outros comportamentos ou atitudes. Num contexto social e cultural tão cioso do valor da liberdade de expressão (por vezes, até em excesso), não é aceitável que se usem “dois pesos e duas medidas”.

             E essa fonteira há de passar, precisamente, pela distinção entre o erro e a pessoa que erra. É lícito criticar o erro (pode até ser um dever moral fazê-lo), sem que isso permita desrespeitar a dignidade da pessoa que erra (numa perspetiva cristã, não é só o respeito que a essa pessoa é devido, é também o amor). Não nos cabe agora analisar cada um dos casos referidos e verificar se em cada um deles as expressões usadas são as mais adequadas ou oportunas, e se em cada um deles foi respeitada esta distinção. Ela foi, indubitavelmente, respeitada nos excertos do catecismo da Igreja Católica acima mencionados, os quais, como vimos, já foram, mesmo assim, considerados contrários ao respeito devido às pessoas de tendência homossexual. 

            A distinção referida (entre a crítica de uma conduta e o respeito pela pessoa em causa) deve servir também noutros âmbitos em que se suscita a necessidade de concordância prática entre a liberdade de expressão e o respeito pela dignidade da pessoa.

            A crítica a determinada ideologia não pode, obviamente, ser vedada em nome do respeito pelas pessoas que aderem a essa ideologia. O respeito pelas pessoas que aderem ao comunismo, ao fascismo ou ao liberalismo não impede a crítica a qualquer destas ideologias.

            No âmbito da atividade política, a crítica de atos e opções concretas (mesmo que em termos duros, agressivos ou injustos) é livre e deve compatibilizar-se com o respeito pela dignidade das pessoas que aí atuam. Esta distinção (entre a livre crítica dos atos e o respeito pela dignidade das pessoas) não pode ser esquecida, para que se evitem dois extremos: um, o de considerar que na vida política “vale tudo”, a dignidade das pessoas não conta e a injúria e difamação de crimes passam a direitos; outro, o de limitar o direito de crítica (base da vida democrática) em nome da tutela da dignidade e honra das pessoas que atuam na política.

            A distinção vale noutros âmbitos. O respeito pelas pessoas que professam determinada religião (cristã, muçulmana ou outra), pela sua dignidade e pelos seus sentimentos religiosos (o que supõe o respeito por figuras e símbolos tidos por sagrados) não pode impedir a crítica à religião, à religião em geral, ou a uma religião em particular. E é possível alcançar a conciliação entre estas duas exigências se a crítica se situar no plano da discussão racional e argumentada e do debate de ideias (a que se pode responder no mesmo plano), não se confundindo com o escárnio e a ofensa gratuita (a que não pode responder-se no plano da discussão racional e do debate de ideias).

            E assim também no âmbito da crítica literária, artística ou desportiva. Pode criticar-se o valor de uma obra ou de uma prestação (até de modo fortemente depreciativo, eventualmente injusto), salvaguardando o respeito devido à pessoa autora dessa obra ou prestação.

            A punição do chamado “discurso de ódio” também há de ter em conta esta distinção. Deve salientar-se que entre os fatores que, de acordo com a generalidade das legislações que punem o “discurso de ódio”, identificam a vulnerabilidade de um grupo carente de especial proteção, estão alguns (como o sexo, a raça, a origem étnica, ou a deficiência, este habitualmente esquecido pelas legislações) em relação aos quais não se suscita a questão da distinção que vimos referindo. Mas não assim em relação a outros: o respeito devido às minorias religiosas não impede a crítica à religião por elas professada. Do mesmo modo, o respeito devido às pessoas de tendência homossexual, particularmente importante por se tratar de uma minoria tradicionalmente marginalizada, não pode impedir a crítica à prática homossexual, ou um juízo ético negativo a respeito dessa prática. 

            Nesta linha, não me parece aceitável a argumentação do Supremo Tribunal canadiano a que acima aludi, segundo a qual ao criticar uma conduta que é constitutiva da identidade de um grupo estaremos a criticar (e ofender) o próprio grupo. Em coerência com este raciocínio, aplicando-o a outros âmbitos, chegaremos a consequências inaceitáveis para quem preze o valor da liberdade de expressão: não seria possível a crítica a determinada religião ou ideologia porque elas fazem parte da identidade de um determinado grupo (como o faria a conduta homossexual) e esse grupo sentir-se-ia ofendido com a crítica a essa religião ou ideologia.

            É sempre possível, em qualquer destes casos, responder à crítica no plano da discussão racional e argumentada, sem recurso a proibições e condenações judiciais. Há quem pretenda aceitar o recurso a essas proibições e condenações no âmbito da crítica à conduta homossexual, quando ele não é aceite em qualquer outro âmbito.

            Deve, pois, manter-se a distinção entre a livre crítica de um comportamento e o respeito pela pessoa que adote esse comportamento, para que sejam simultaneamente salvaguardados, em quaisquer âmbitos (sem “dois pesos e duas medidas”), a liberdade de expressão e o respeito pela dignidade das pessoas.


[1] Pode ver-se informação sobre o caso em www.akegreen.org.
[3] Ver www.mercatornet.com /conjugality/ 29/1/2013).
[4] Ver www.lifesitenews.com,21/3/2013, e www.lastampa.it, 28/3/2013
[5] Ver www.lifesitenews.com, 18/10/2013
[8] Ver www.zenit.org, 18/7/2013.

[9] Ver Avvenire, 25/7/2013

[10] Ver Avvenire, 24/7/2013, e Adriana Cosseddu, Riscrivere l´ Umanità dell´Uomo?in Città Nuova, nº 20, 25/10/2013, pgs. 20 e 21.

sábado, 7 de dezembro de 2013

Rainha

Pe. Gonçalo Portocarrero de Almada
ionline 2013-12-07




Não obstante a antidemocrática cláusula constitucional que não permite outro regime que não seja o republicano, Portugal tem uma Rainha: Nossa Senhora, de quem amanhã se festeja a Imaculada Conceição.
Em poucos países está, como nesta abençoada terra de Santa Maria, tão arraigada esta devoção. Com efeito, embora a correspondente definição dogmática seja relativamente tardia, uma vez que só ocorreu em 1854, em Portugal sempre se acreditou que Maria foi concebida sem pecado original, por um especial privilégio devido à sua futura maternidade divina e por antecipada aplicação dos méritos de Cristo. Na Universidade de Coimbra, em tempos idos, ninguém podia obter um grau académico sem se comprometer a defender a Imaculada Conceição de Nossa Senhora.
Foi em circunstâncias particularmente difíceis da história nacional que, à Mãe de Deus, foi dado o título de Rainha de Portugal: precisamente quando, recuperada a independência a 1 de Dezembro de 1640, o país teve que defender-se, com armas na mão, das pretensões castelhanas à nossa terra, finalmente liberta da dominação filipina.
Em tempos igualmente conturbados, como foram a primeira República e, mais recentemente, o PREC, muitos portugueses recorreram, com êxito, a esta nossa Rainha. Nesta prolongada crise nacional – moral, demográfica, política e económica – importa não esquecer esta celestial protectora. Se mais se rezasse a Nossa Senhora, decerto que mais depressa e melhor Portugal ultrapassaria a actual situação. Como quando, em 1385, 1640 e 1975, sob o pendão da nossa Rainha, se garantiu a nossa soberania e liberdade.
Para quem duvida da eficácia destes meios espirituais, vale a pena recordar que, há escassos meses, uma aparentemente inevitável ocupação militar da Síria foi talvez impedida, graças à oração e ao jejum que, para este efeito, o Papa Francisco convocou os cristãos e os homens de boa vontade de todo o mundo.